Do total de trabalhadores libertos, mais de 500 trabalhavam na indústria da cana-de-açúcar. Estado de Minas Gerais lidera o número de casos
Somente em 2022, 2.218 pessoas foram libertadas no Brasil de trabalho escravo em setores ligados à agroindústria, conforme dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), ligada à CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil). Trata-se do maior resgate já feito em uma década. O número de trabalhadores e trabalhadoras resgatados integra 207 casos registrados no último ano.Em relação a 2021, houve aumento de 29% no número de pessoas resgatadas de trabalhos em condições análogas à escravidão e alta de 32% na quantidade de casos. O setor sucroalcooleiro, responsável pela produção de açúcar, álcool e outros derivados da cana-de-açúcar, é o que teve o maior número de pessoas resgatadas: 523 trabalhadores.O número de trabalhadores resgatados no campo representa 88% do total de pessoas libertas dessa condição no país (2.516), sendo os outros 12% de trabalhadores resgatados de atividades laborais nas cidades. Do total de resgatados, 62% estavam trabalhando, principalmente, em monoculturas.“Contudo, esses dados não representam o total de pessoas que trabalham em condições sub-humanas no campo brasileiro, uma vez que nem todas as ocorrências são notificadas ou mesmo descobertas”, alertou a CPT em nota.O estado de Minas Gerais liderou o número de casos e pessoas resgatadas (62 e 984, respectivamente), seguido por Goiás (17 casos, com 258 pessoas resgatadas), Piauí (23 e 180), Rio Grande do Sul (10 e 148), Mato Grosso do Sul (10 e 116) e São Paulo (10 e 87).Recentemente, a Secretaria de Inspeção do Trabalho do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) publicou a atualização da chamada “lista suja” de empregadores acusados de submeter trabalhadores e trabalhadoras a condições análogas à escravidão. A maioria das empresas envolvidas com trabalho escravo é do agronegócio.A lista da secretaria aponta que, ao todo, 289 empregadores, entre pessoas físicas e jurídicas, integram a atual relação de flagrados com mão de obra em situação análoga à escravidão. Na comparação com a lista anterior, 132 empresas ou pessoas passaram a integrar o cadastro, e 17 foram excluídas.
Avança no Congresso projeto que visa expropriar bens de responsáveis por trabalho escravo no país
A lei brasileira determina que é crime submeter alguém à condição de trabalho análogo à escravidão. Também é punível por lei qualquer pessoa que atue para impedir o direito de ir e vir do trabalhador que esteja nessa condição.No Congresso Nacional, está em tramitação o PL 5.970/2019, de autoria do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que institui a expropriação de propriedades urbanas e rurais onde for explorada mão de obra análoga à escravidão. Contudo, isso só ocorrerá após o trânsito em julgado de sentença (quando não cabe mais recurso) no âmbito penal ou trabalhista.Na semana passada, o projeto avançou no Senado, com sua aprovação unânime na Comissão de Direitos Humanos. Com a expropriação, o proprietário perderá o bem sem direito a qualquer indenização por parte do Estado, diferentemente do que ocorre nos casos de desapropriação, em que há uma compensação financeira pela tomada do objeto de valor.A expropriação de imóveis urbanos ou rurais em que for constatada a exploração de trabalho em condições análogas às de escravidão está prevista no artigo 243 da Constituição Federal. Mas a falta de uma lei que regulamente esse processo tem impedido a aplicação desse tipo de punição aos criminosos.Violência no campo também aumenta
Em 2022, segundo dados da CPT, a violência no campo também aumentou. Foram 553 ocorrências, que vitimaram 1.095 pessoas, incluindo crianças e adolescentes. O número de casos é 50% maior do que o registrado em 2021 (368, com 819 vítimas).Também no ano passado, foram registradas 123 tentativas de homicídio em áreas rurais. O número é o maior já registrado nos últimos 23 anos. Outras 47 pessoas foram assassinadas.Segundo a CPT, a violência no campo aumentou principalmente ao longo da gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que incentivou o armamento e fragilizou órgãos voltados à fiscalização.De 2019 a 2022, nove adolescentes e uma criança foram mortos no campo. Destes, cinco eram indígenas.“Essa tendência alarmante sugere uma tentativa de aniquilar o futuro do país, bem como a permanência dos povos originários e camponeses em seus territórios”, ressalta a entidade.- Capa: Arquivo MST