Pesquisa inédita em SC ouviu gestores escolares e professores que atuam diretamente com o NEM na rede estadual e identificou impactos na educação pública catarinense
Uma pesquisa inédita feita pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação na Rede Pública de Ensino do Estado de Santa Catarina (Sinte/SC), aponta que o Novo Ensino Médio (NEM) não está cumprindo a função anunciada inicialmente – que era de melhorar a qualidade da educação pública.O sindicato aponta que o NEM é uma política excludente, que contribui para ampliar as desigualdades sociais entre estudantes das redes pública e privada. Isso porque, enquanto o novo modelo educacional tende a direcionar estudantes das escolas públicas para cursos técnicos e profissionalizantes (até mesmo aumentando em um ano o tempo de estudo dos estudantes do período noturno), alunos da rede particular continuam sendo preparados para entrarem nas universidades, especialmente as mais requisitadas e concorridas, as universidades públicas.Não bastasse isso, no levantamento feito pelo Sinte/SC, professores e gestores avaliaram uma série de pontos sobre a implementação do NEM, e o resultado não foi positivo: foi reduzida a carga horária de disciplinas consideradas essenciais, como português e matemática; falta estrutura física, como laboratórios e espaços adequados para a prática de várias aulas; e muitos docentes tiveram que abraçar novas disciplinas sem receber instrução adequada para tal, a exemplo de professores de Português e Matemática que agora dão aulas de Empreendedorismo.Se a promessa era de que os estudantes da rede poderiam ter uma oferta de disciplinas mais interessantes, atrativas e até mesmo que proporcionassem uma educação mais divertida, a realidade é outra. Os professores estão ainda mais sobrecarregados e a carga horária dos estudantes aumentou de tal forma que tende a desestimular a conclusão do Ensino Médio, aumentando a evasão escolar.Exemplo disso é que, para cumprir a carga horária, alunos dos períodos matutino e vespertino precisam estar na escola, em alguns dias da semana, também no contraturno. Já os que estudam a noite – geralmente alunos que trabalham durante o dia – precisam cursar quatro anos de Ensino Médio, um ano a mais que os estudantes diurnos de escolas públicas e os alunos de escolas privadas.Para o secretário de Assuntos Educacionais e Culturais do Sinte/SC, Luiz Carlos Vieira, a implantação do NEM foi uma mudança que enfraqueceu muito a educação pública brasileira. Segundo ele, a conclusão da pesquisa feita pelo sindicato é de que a efetivação do Novo Ensino Médio aconteceu de forma totalmente “atravessada”, pois não respeitou, sequer, a estrutura das escolas.“Nós, nesse momento, entendemos que estamos num processo muito importante, o da consulta pública que está sendo realizada pelo Ministério da Educação. Essa consulta só aconteceu graças à pressão de muitas entidades da educação, que cobraram do novo governo a revogação do NEM. Segundo o Ministério da Educação, eles precisavam de números, de dados, e saber qual é a opinião dos envolvidos. Então, nós estamos convocando toda a comunidade escolar para responder e dar sua opinião sobre o NEM e, juntos com a CNTE [Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação], cobrar a revogação dessa contrarreforma”, completa Vieira.PESQUISA DO SINTE/SC | O levantamento “Impactos do Novo Ensino Médio na Educação Pública Catarinense” foi coordenada pelo Sinte/SC, e ouviu professores e gestores da rede em todo o Estado, para tentar compreender pontos como: o reordenamento do currículo e oferta do Ensino Médio; o papel da Secretaria de Estado da Educação e das Coordenadorias Regionais de Educação; a formação continuada de professores; as condições de trabalho docente e a infraestrutura das escolas.Para realização da pesquisa, o sindicato contou com apoio analítico da professora doutora Filomena Lucia Gossler Rodrigues da Silva (IFC – Camboriú), do professor mestre Juliano André Deotti da Silva (Doutorando em Educação – UFPR) e do professor doutor Willian Simões (UFFS – Chapecó).A pesquisa aconteceu no segundo semestre de 2022 e ouviu professores e gestores que estão atuando diretamente na implementação do novo formato do Ensino Médio.
Fonte: Núbia Garcia, Assessoria Sinte/SC
Confira a pesquisa completa no site do Sinte/SC
O NEM SOB A ÓTICA DE QUEM VIVE O DIA A DIA DA EDUCAÇÃO | Aos 17 anos, Maria Rosa está cursando o segundo ano do Ensino Médio, em uma escola pública estadual, localizada em Florianópolis. Ela trabalha todas as manhãs e, por isso, estuda no período noturno. Com a implantação do Novo Ensino Médio, vai demorar quatro anos para concluir esta etapa da educação, ou seja, um ano a mais do que os estudantes dos períodos matutino e vespertino.Integrante do grêmio estudantil de sua escola, Maria tomou como missão pessoal visitar várias outras escolas no município para debater a realidade do NEM e convidar os estudantes para que se posicionem sobre os entraves que enfrentam na educação.“É muito triste ver meus colegas e tantos outros estudantes desistindo de estudar, desistindo de ter um futuro diferente, simplesmente porque a educação que estão tendo agora não dá perspectiva pra eles. Cursar um ano a mais do que os alunos que conseguem estudar durante o dia, é muito desanimador”, comenta.Para ela, este período de debates sobre o Novo Ensino Médio, especialmente com a consulta pública que está sendo feita pelo Ministério da Educação, é uma excelente oportunidade para que os profissionais da educação, os estudantes e os cidadãos se unam para decidir qual o valor que a escola tem e qual sua importância na sociedade.Crítica do NEM, Maria acredita que este formato de educação amplia as desigualdades entre os estudantes, especialmente por não ampliar as perspectivas dos alunos de escolas públicas sobre seu futuro – seja para cursar uma faculdade, seja para o mercado de trabalho.“O Novo Ensino Médio é uma maneira de, cada vez mais, pegar o pessoal da classe baixa e continuar deixando ele ali. Não tem nenhuma disciplina do NEM que eu considero positiva, porque, a partir do momento que o propósito do negócio é falho, tudo o que acontece dentro dele é falho. Eu sinto falta de todas as disciplinas que estão relacionadas ao meu futuro, especialmente os que me aproximam de uma universidade federal. Com a educação oferecida pelo Novo Ensino Médio, sinto que estou totalmente despreparada para o vestibular, pro ENEM e, muito menos, pro mercado de trabalho. Eu sinto que estou sendo despreparada para a vida”, avalia.Professor de Sociologia e Filosofia, Marcos José Jubanski atua na rede estadual, no município de São José, desde 2004. Ele acredita que o NEM não está entregando a qualidade educacional que havia prometido.Para Marcos, a mudança no formato educacional não trouxe algo que seria desejável: que houvesse uma ponte entre o que se ensina dentro da escola e as experiências dos estudantes nos diversos ambientes extraescolares que frequentam. “Uma escola que pensa somente em ‘preparar’ para o mercado de trabalho acaba por negligenciar uma série de outras possibilidades formativas de igual ou até mesmo mais importantes, como a superação dos grandes desafios, individuais ou coletivos, que uma educação integral, quando levada a sério, assumiria como tarefa educativa”, enfatiza.O professor entende que, “se levar em consideração a função da escola, que é de ensinar aquilo que a humanidade já tem conquistado em termos científicos – e, nesta tarefa, há que considerar que a escola pública no Brasil está beirando o desespero – mesmo assim, ajudaria muito se as escolas contassem com um mínimo de equipamentos de laboratórios – tanto nas ciências da natureza, passando pela matemática, até as salas de laboratórios do núcleo das ciências humanas. Hoje não se tem nada disso”, destaca o professor.A proposta de reforma da educação a partir do Novo Ensino Médio, para Marcos, limitou-se a reorganizar a grade curricular. “Ou seja, fez o mínimo, e talvez o menos necessário. Ou talvez o desnecessário. Deixando muitas outras coisas para depois. Ou para nunca mais? Não reorganizou os espaços escolares. Neste sentido, com menor ou maior necessidade, todas as escolas necessitariam passar por reformas e ampliações”, completa.
Fonte: Núbia Garcia, Assessoria Sinte/SC